Relatório Especial
07 2023

Conceção do sistema de controlo da Comissão para o Mecanismo de Recuperação e Resiliência Novo modelo de aplicação mantém uma lacuna de garantia e prestação de contas a nível da UE, apesar dos amplos trabalhos previstos

Sobre o relatório:O Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) tem uma dotação de 723,8 mil milhões de euros (a preços correntes) e representa o principal instrumento de financiamento da UE para atenuar o impacto económico e social da pandemia de COVID-19. O Tribunal examinou a conceção do sistema de controlo da Comissão para o MRR, a fim de avaliar de que forma contribui para assegurar o cumprimento satisfatório dos marcos e das metas e a proteção dos interesses financeiros da União. Concluiu que, num período relativamente curto, a Comissão concebeu um sistema de controlo que prevê um amplo processo para verificar o cumprimento dos marcos e das metas. No entanto, mantém uma lacuna de garantia e prestação de contas a nível da UE na proteção dos interesses financeiros da União. O Tribunal recomenda que a Comissão deve determinar medidas para colmatar esta lacuna de garantia, bem como elaborar orientações sobre as correções e a reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos.

Relatório Especial do TCE apresentado nos termos do artigo 287º, nº 4, segundo parágrafo, do TFUE.

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PDF Relatório sobre as verificações da Comissão relativas ao Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR)

Síntese

I O Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) é o principal instrumento do Instrumento de Recuperação da União Europeia e foi criado para prestar apoio financeiro em larga escala aos investimentos públicos e às reformas nos Estados‑Membros. Para esse efeito, tem uma dotação de 723,8 mil milhões de euros (a preços correntes) para empréstimos (385,8 mil milhões de euros) e subvenções (338 mil milhões de euros). O financiamento destas reformas e investimentos nos Estados‑Membros começou no início da pandemia, em fevereiro de 2020, e prosseguirá até 31 de dezembro de 2026. O regulamento aplicável entrou em vigor em 19 de fevereiro de 2021.

II O MRR segue um modelo de despesa diferente do de outros programas de despesas da UE. Os pagamentos são efetuados aos Estados‑Membros quando os marcos e as metas subjacentes tenham sido cumpridos de forma satisfatória, com base na avaliação da Comissão. Embora a observância das regras nacionais e da UE (por exemplo, em matéria de contratos públicos ou de elegibilidade dos custos reembolsáveis) não constitua uma condição para efetuar tais pagamentos, os projetos de investimento dos Estados‑Membros financiados pelo MRR têm de as cumprir.

III O Tribunal realizou esta auditoria tendo em conta o elevado número de desembolsos do MRR ainda a efetuar até ao encerramento deste mecanismo no final de 2026. O objetivo foi avaliar a conceção do sistema de controlo da Comissão para o MRR e ajudar a assegurar a sua adequação. A este respeito, o Tribunal analisou de que forma o sistema garante o cumprimento dos marcos e das metas e a proteção dos interesses financeiros da União (situação no final de abril de 2022). Complementou as provas obtidas através do exame dos procedimentos da Comissão com observações pertinentes da sua auditoria no âmbito da Declaração de Fiabilidade sobre a regularidade das despesas do MRR referentes a 2021.

IV O Tribunal conclui que, num período relativamente curto, a Comissão concebeu um sistema de controlo que prevê um amplo processo para verificar o cumprimento dos marcos e das metas. No entanto, este sistema de controlo disponibiliza poucas informações verificadas a nível da União que atestem que os projetos de investimento financiados pelo MRR respeitam as regras nacionais e da UE. A falta destas informações afeta a garantia que a Comissão pode dar e resulta numa lacuna de prestação de contas a nível da União.

V No que diz respeito à garantia do cumprimento dos marcos e das metas, o Tribunal considerou que os procedimentos eram abrangentes. Os controlos ex ante para a avaliação preliminar são complementados por auditorias adicionais no local. Porém, as várias fases da avaliação preliminar não foram suficientemente especificadas nem foram documentadas de forma cabal. O Tribunal observa igualmente que ainda não existe um método para quantificar o impacto do incumprimento de um marco ou meta e que não existem orientações sobre o risco de não ser detetada a reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos.

VI No que diz respeito à proteção dos interesses financeiros da União, o Tribunal observa que a Comissão planeou auditorias de sistemas em todos os Estados‑Membros, que incidirão nos sistemas de controlo destes relacionados com a fraude, a corrupção, os conflitos de interesses e o duplo financiamento. Todavia, não examinarão se os Estados‑Membros verificam adequadamente o cumprimento das regras nacionais e da UE pelos projetos de investimento financiados pelo MRR. Consequentemente, são escassas as informações verificadas a nível da União sobre este aspeto. A falta de tais informações afeta a garantia que a Comissão pode dar a este respeito. A responsabilidade que esta assume em termos de proteção dos interesses financeiros da União não vai além da garantia de recuperar qualquer montante devido em casos de fraude, corrupção ou conflito de interesses que não tenham sido corrigidos pelo Estado‑Membro ou de incumprimento grave da convenção de financiamento. O Tribunal constatou igualmente que o Sistema de Gestão de Irregularidades não contém informações centralizadas e normalizadas sobre fraudes relacionadas com o MRR e que os diferentes níveis de correções fixas a aplicar na eventualidade de se detetarem deficiências nos sistemas de controlo dos Estados‑Membros não estão suficientemente definidos.

VII O Tribunal recomenda que a Comissão deve:

  • melhorar os procedimentos de verificação ex ante;
  • elaborar orientações sobre a reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos;
  • colmatar a lacuna de garantia a nível da UE no que diz respeito ao cumprimento das regras nacionais e da União pelos projetos de investimento financiados pelo MRR;
  • harmonizar a comunicação de informações sobre fraudes no âmbito do MRR;
  • elaborar orientações internas relativas às correções, tal como previsto nas convenções de financiamento.

Introdução

Breve síntese do Mecanismo de Recuperação e Resiliência

01 O Instrumento de Recuperação da União Europeia (IRUE) é o fundo temporário da UE destinado a apoiar os Estados‑Membros nos seus esforços para diminuírem o impacto socioeconómico da pandemia de COVID-19 e retomarem a trajetória do crescimento sustentável. O Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) é o principal instrumento de canalização dos fundos do IRUE. Presta apoio financeiro em grande escala para a realização de reformas e investimentos, a fim de acelerar a recuperação económica dos Estados‑Membros face às consequências da pandemia de COVID-19 e de os tornar mais resilientes.

02 O MRR foi criado pelo Regulamento (UE) 2021/241 (a seguir designado por «Regulamento»), que entrou em vigor em 19 de fevereiro de 2021. Destina‑se a financiar reformas e projetos de investimento nos Estados‑Membros desde o início da pandemia, em fevereiro de 2020, e prosseguirá até 31 de dezembro de 2026. Para esse efeito, tem uma dotação de 723,8 mil milhões de euros (a preços correntes) para empréstimos (385,8 mil milhões de euros) e subvenções (338 mil milhões de euros).

03 O MRR segue um modelo de despesa especial. A Comissão Europeia executa-o em regime de gestão direta, tendo os Estados‑Membros como beneficiários1. A condição para o pagamento aos Estados‑Membros a partir deste mecanismo é o cumprimento satisfatório de marcos ou metas predefinidos, através da execução de reformas e projetos de investimento2.

04 A legalidade e regularidade (a seguir designadas apenas por «regularidade») das despesas no âmbito de outros programas da UE depende principalmente da elegibilidade do beneficiário, do projeto e dos custos declarados. A elegibilidade desse financiamento é frequentemente regida por condições aplicáveis aos custos que é possível realizar e declarar, que também podem ter de ser identificáveis e verificáveis. As condições de elegibilidade para esse financiamento incluem igualmente as regras da UE que garantem o funcionamento eficaz do mercado único (ou seja, as regras aplicáveis à contratação pública e aos auxílios estatais) e o cumprimento das regras nacionais.

05 A elegibilidade do beneficiário, do projeto e dos custos de execução dos projetos de investimento financiados pelo MRR não é uma condição que a Comissão avalia quando efetua o pagamento deste mecanismo ao Estado‑Membro. Porém, o Regulamento abrange este aspeto, invocando a proteção dos interesses financeiros da União, que os Estados‑Membros, juntamente com a Comissão, devem assegurar em consonância com as respetivas competências. Neste contexto, o Regulamento prevê que as medidas de apoio ao MRR devem respeitar a legislação nacional e da UE aplicável (em especial no que diz respeito à prevenção, deteção e correção de fraudes, corrupção e conflitos de interesses), bem como assegurar que não há um incumprimento grave das obrigações estabelecidas na convenção de financiamento, nomeadamente no que diz respeito ao duplo financiamento. Para este efeito, os Estados‑Membros devem aplicar um sistema de controlo interno eficaz e eficiente e recuperar os montantes indevidamente pagos ou utilizados de forma incorreta3. Se os Estados‑Membros não recuperarem qualquer montante indevidamente pago em casos de fraude, corrupção ou conflito de interesses, a Comissão pode fazê‑lo4.

Execução do MRR

06 O facto de o modelo de aplicação do MRR diferir do de outros programas de despesas da UE significa que a sua execução está também sujeita a um processo especial, que é sintetizado na figura 1 e descrito a seguir em mais pormenor.

Figura 1 – Processo de execução do MRR

Fonte: TCE.

07 Para beneficiarem do MRR, os Estados‑Membros têm de elaborar planos de recuperação e resiliência (PRR) nacionais que cumpram as condições estabelecidas no Regulamento5. Estes devem incluir um pacote coerente de investimentos públicos e reformas, agrupados em medidas por sua vez reunidas em componentes temáticas. Os Estados‑Membros devem fixar marcos e metas para cada projeto de investimento e reforma e fornecer pormenores sobre a base de referência associada.

08 Os Estados‑Membros devem igualmente conceber sistemas de gestão e de controlo adequados. Podem utilizar os sistemas nacionais existentes ou criar sistemas específicos para o MRR.

09 Os pagamentos ao abrigo do MRR estão sujeitos à condição de os Estados‑Membros cumprirem satisfatoriamente os marcos e as metas definidos nos anexos das decisões de execução do Conselho que aprovam os respetivos PRR. Outro elemento a considerar é que as medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos não devem ter sido revertidas. Os Estados‑Membros podem solicitar pagamentos, no máximo, duas vezes por ano, desde que comprovem de modo suficiente o cumprimento satisfatório dos marcos e das metas correspondentes6.

10 Para receberem pagamentos ao abrigo do MRR, os Estados‑Membros devem apresentar, juntamente com cada pedido de pagamento, os seguintes documentos:

  • informações e elementos de prova que confirmem o cumprimento dos marcos e das metas estabelecidos no anexo da decisão de execução do Conselho;
  • um resumo das auditorias efetuadas pelas autoridades do Estado‑Membro, incluindo informações pormenorizadas sobre as vulnerabilidades encontradas e as medidas corretivas adotadas7;
  • uma declaração de gestão8 que comprove que:
    • os fundos foram utilizados para a finalidade prevista;
    • a informação apresentada com o pedido de pagamento está completa, é exata e fiável;
    • os sistemas de controlo aplicados fornecem as garantias necessárias de que os fundos foram geridos de acordo com todas as regras aplicáveis, em especial as regras relativas à prevenção de:
      • conflitos de interesses, fraude, corrupção;
      • duplo financiamento.

11 A avaliação da Comissão é um processo que decorre em duas fases. Em primeiro lugar, a Comissão avalia os pedidos de pagamento com base nos dados e informações prestados pelos Estados‑Membros. O objetivo desta avaliação preliminar é assegurar que os marcos e as metas foram cumpridos de forma satisfatória9.

12 Com base neste trabalho, a Comissão apresenta a avaliação preliminar ao Comité Económico e Financeiro do Conselho e solicita o seu parecer. Na sequência do parecer do Comité, adota então uma decisão sobre o pagamento, que deve ser previamente apresentada a um comité de comitologia, composto por representantes dos Estados‑Membros, no âmbito do procedimento de exame. Por último, adota uma decisão de execução que autoriza o pagamento e os fundos são desembolsados.

Quadro de controlo da Comissão para o MRR

13 O modelo especial de aplicação do MRR e o volume de fundos da UE disponibilizados ao abrigo deste mecanismo exigem um quadro de controlo específico a nível da Comissão e dos Estados‑Membros que garanta o cumprimento dos marcos e das metas e a proteção dos interesses financeiros da União.

14 O quadro de controlo criado pela Comissão para o efeito, delineado no Relatório Anual de Atividades (RAA) da Direção‑Geral (DG) dos Assuntos Económicos e Financeiros (ECFIN) relativo a 2021, contém:

  • a avaliação da pertinência, eficácia, eficiência e coerência dos PRR apresentados pelos Estados‑Membros antes da realização de qualquer pagamento. Esta avaliação prevê igualmente a verificação da adequação dos sistemas de controlo dos Estados‑Membros, tal como delineados nos seus PRR;
  • um sistema de controlo em duas fases, que consiste em verificações ex ante dos pedidos de pagamento dos Estados‑Membros e auditorias ex post complementares após a realização dos pagamentos. Estão igualmente previstas auditorias de sistemas centradas na proteção dos interesses financeiros da União. A figura 2 sintetiza o sistema de controlo da Comissão, com estes dois elementos que seguem a avaliação dos PRR.

Figura 2 – Elementos do sistema de controlo da Comissão para o MRR

Fonte: TCE.

15 O Tribunal auditou anteriormente a avaliação dos PRR realizada pela Comissão e apresentou os resultados no Relatório Especial 21/202210. O objeto da presente auditoria e relatório é a conceção dos dois elementos do sistema de controlo da Comissão apresentados na figura 2.

Trabalhos do Tribunal sobre o MRR

16 O presente trabalho é parte integrante de uma série de auditorias e documentos de análise dedicados ao MRR. A caixa 1 apresenta mais informações sobre os trabalhos realizados até à data e os resultados obtidos, com destaque para as questões relacionadas com o controlo.

Caixa 1

Trabalhos do Tribunal sobre o MRR

O Tribunal formulou o seu parecer sobre o MRR quando da criação deste mecanismo11. Concluindo embora, em geral, que o MRR tem potencial para ajudar os Estados‑Membros a aliviar o impacto económico e financeiro da pandemia, realçou a relevância de medidas eficazes de luta contra a fraude e as irregularidades, para combater os riscos decorrentes da existência de volume significativo de recursos adicionais a despender num curto período de tempo, como sucede com o MRR.

Em 2022, o Tribunal examinou a avaliação dos PRR nacionais realizada pela Comissão12, tendo concluído que foi globalmente adequada, dada a complexidade do processo e as limitações de tempo. Contudo, detetou várias insuficiências no processo, bem como riscos que podem impedir uma boa execução do MRR. Neste contexto, o Tribunal sublinhou que a avaliação dos mecanismos de acompanhamento e de controlo propostos pelos Estados‑Membros se baseou, pelo menos em parte, na descrição de sistemas que ainda não tinham sido criados.

No seu Relatório Anual relativo a 202113, o Tribunal examinou o único pagamento efetuado pela Comissão em 2021 (em dezembro). Avaliou um marco como não tendo sido cumprido de forma satisfatória e considerou que o impacto dessa avaliação (que a Comissão não aceitou) não era significativo. Neste contexto, observou que a Comissão ainda não tinha definido um método para quantificar o impacto do incumprimento de um marco ou de uma meta.

A análise comparativa dos fundos da política de coesão e do MRR realizada pelo Tribunal mostra que têm semelhanças consideráveis14. Simultaneamente, os dois instrumentos diferem em muitos aspetos, devido aos seus objetivos distintos. No que respeita às disposições de controlo e de auditoria, o Tribunal registou que o MRR se centra no cumprimento satisfatório dos marcos e das metas. No caso dos fundos da política de coesão, os mecanismos de controlo e de auditoria ao nível da Comissão e dos Estados‑Membros incidem principalmente na regularidade das despesas. No que diz respeito ao MRR, a Comissão deve assegurar que os interesses financeiros da UE são protegidos com eficácia. Para o efeito, deve obter dos Estados‑Membros garantias suficientes de que executam o MRR em conformidade com a legislação da UE e nacional.

Âmbito e método da auditoria

17 O objetivo da presente auditoria foi avaliar a conceção do sistema de controlo da Comissão para o MRR. Para o efeito, o Tribunal examinou se este sistema permitia garantir que:

  • os pagamentos aos Estados‑Membros são efetuados por estes terem cumprido os marcos e/ou metas predefinidos;
  • os interesses financeiros da União são protegidos.

18 Em primeiro lugar, o Tribunal examinou o sistema de controlo da Comissão para o MRR de um ponto de vista conceptual, mais geral, de modo a determinar o que abrange e de que forma assegura o cumprimento satisfatório dos marcos e das metas e a proteção dos interesses financeiros da União. Neste exame, incluiu a avaliação inicial realizada pela Comissão relativamente aos sistemas de controlo delineados nos PRR dos Estados‑Membros, uma vez que fazem parte do quadro de controlo. O Tribunal concluiu a sua avaliação da conceção do sistema de controlo da Comissão com uma análise pormenorizada do trabalho planeado e dos procedimentos definidos para os seus dois elementos. Esta análise visou determinar eventuais insuficiências nos procedimentos e auditorias que fazem parte do sistema de controlo da Comissão.

19 Para obter os elementos de prova necessários para fundamentar as suas observações, conclusões e recomendações, o Tribunal:

  • realizou entrevistas e reuniões com representantes da DG ECFIN da Comissão e do Grupo de Trabalho Recuperação e Resiliência;
  • examinou os procedimentos da Comissão e outros documentos pertinentes, como as convenções de financiamento e as disposições operacionais;
  • analisou os procedimentos da Comissão em matéria de verificações ex ante e auditorias ex post, bem como a estratégia de auditoria, as orientações relativas à amostragem, as listas de controlo internas e outras orientações;
  • consultou o RAA da DG ECFIN relativo a 2021.

20 O Tribunal complementou as provas obtidas através da presente auditoria com observações da sua auditoria no âmbito da Declaração de Fiabilidade sobre a regularidade das despesas do MRR referentes a 202115. Esta auditoria tinha por objetivo verificar o cumprimento satisfatório dos 52 marcos subjacentes ao único pagamento que a Comissão efetuou a um Estado‑Membro (Espanha) em 2021. O Tribunal examinou igualmente a avaliação preliminar efetuada pela Comissão sobre quatro metas selecionadas subjacentes ao pagamento efetuado a França em março de 2022.

21 O Tribunal realizou a auditoria durante a fase inicial da execução do MRR, altura em que foi feito o primeiro pagamento, mas antes do desembolso de um número significativo de pagamentos. Por conseguinte, a auditoria centrou‑se na conceção do sistema de controlo do MRR, tal como existia no final de abril de 2022, e não no seu funcionamento efetivo.

22 Além disso, o Tribunal não abrangeu a conceção ou a eficácia dos sistemas de controlo do MRR dos Estados‑Membros nesta auditoria, mas prevê fazê‑lo no futuro.

23 Com a presente auditoria e as suas recomendações, o Tribunal pretende ajudar a garantir que a Comissão dispõe de um sistema de controlo adequado, tanto no que se refere ao cumprimento das condições de pagamento como à proteção eficaz dos interesses financeiros da União, tendo em conta o elevado número de desembolsos do MRR ainda a efetuar até ao encerramento deste mecanismo no final de 2026.

Observações

Existe uma lacuna de garantia e prestação de contas a nível da UE na proteção dos interesses financeiros da União

24 Nesta secção do relatório, o Tribunal examina o sistema de controlo da Comissão para o MRR de um ponto de vista conceptual e mais geral, de modo a determinar se e de que forma contribui para assegurar o cumprimento satisfatório dos marcos e das metas e a proteção dos interesses financeiros da União. Para o efeito, tem igualmente em conta a avaliação que a Comissão realizou dos sistemas de controlo dos Estados‑Membros, tal como delineados nos seus PRR, uma vez que se trata do primeiro elemento do quadro de controlo do MRR16. As observações do Tribunal têm implicações em termos de garantia e prestação de contas e são apresentadas nos pontos que se seguem.

A avaliação das disposições de controlo realizada pela Comissão foi abrangente, mas baseou‑se em parte em sistemas que ainda não estão em funcionamento

25 Para beneficiarem do apoio ao abrigo do MRR, os Estados‑Membros apresentaram à Comissão projetos de PRR nacionais, que a Comissão avaliou com base em 11 critérios estabelecidos no Regulamento. Um destes critérios previa que os Estados‑Membros dispusessem de sistemas e disposições de controlo capazes de prevenir, detetar e corrigir a corrupção, a fraude, as irregularidades, os conflitos de interesses e o duplo financiamento.

26 No seu Relatório Especial 21/2022, o Tribunal verificou se a Comissão tinha avaliado as disposições de controlo dos Estados‑Membros, nomeadamente a clareza das suas estruturas, os papéis e as responsabilidades dos seus diferentes organismos, os sistemas e processos planeados e as capacidades necessárias.

27 O Tribunal retira a conclusão geral de que a avaliação da Comissão sobre os PRR foi adequada dada a complexidade do processo e as limitações de tempo. No que respeita especificamente aos sistemas de controlo, constatou que a avaliação que a Comissão realizou dos mecanismos de controlo propostos pelos Estados‑Membros detetou corretamente as lacunas e deficiências que requerem medidas suplementares. No entanto, a avaliação baseou‑se, pelo menos em parte, na descrição de sistemas que ainda não tinham sido criados, pelo que terá de ser confirmada através de mais trabalhos no local. Além disso, a Comissão introduziu marcos suplementares para 16 Estados‑Membros, nos casos em que estas lacunas ou deficiências exigiam a aplicação de medidas adicionais antes do primeiro pagamento17. O facto de não estar em vigor um sistema de controlo plenamente funcional implica o risco de os interesses financeiros da UE poderem não ser suficientemente protegidos até ao cumprimento desses marcos.

Cumprimento dos marcos e das metas avaliado por verificações ex ante e auditorias ex post

28 As verificações ex ante efetuadas pela Comissão aos pedidos de pagamento dos Estados‑Membros e as auditorias ex post conexas centram‑se nas condições de pagamento e na prova, apresentada pelos Estados‑Membros, do cumprimento satisfatório dos marcos e das metas. As verificações e as auditorias ex post relativas aos marcos e às metas não incidem sobre o incumprimento das regras nacionais e da UE (ponto 09).

29 Por exemplo, se um projeto de investimento financiado pelo MRR não cumprir as regras nacionais e da UE (como regras aplicáveis à contratação pública, aos auxílios estatais ou à elegibilidade dos custos ou projetos), este facto não afetará o resultado da avaliação preliminar da Comissão sobre o cumprimento satisfatório da meta em causa. Desde que esta seja atingida em conformidade com a descrição constante do anexo da decisão de execução do Conselho, a Comissão é obrigada a efetuar o pagamento ao Estado‑Membro em causa18.

30 Além disso, o Tribunal regista que o Regulamento determina o respeito por princípios horizontais19, prevendo que o apoio do MRR não substitui as despesas nacionais recorrentes, salvo em casos devidamente justificados, e deve observar tanto o princípio da adicionalidade do financiamento da União a que se refere o artigo 9º do Regulamento, como o de «não prejudicar significativamente». Dado que o Regulamento não considera o cumprimento destes princípios uma condição para o pagamento20, a Comissão não os inclui nas suas verificações ex ante, exceto se esse cumprimento for obrigatório com base na decisão de execução do Conselho, como pode acontecer no caso do princípio de «não prejudicar significativamente». Este princípio foi verificado quando a Comissão avaliou os PRR. Na sua auditoria anterior, o Tribunal constatou, que, em resultado da avaliação da Comissão, todas as medidas incluídas nos PRR aprovados estavam em conformidade com o referido princípio. Todavia, observou ainda que estes planos não continham de forma sistemática, sob a forma de um marco ou de uma meta, medidas destinadas a atenuar o impacto ambiental. Acrescentou ainda que medidas que não respeitam esse princípio podem ser financiadas fora do MRR21.

31 No Relatório Especial 21/2022, o Tribunal observou ainda que os marcos e as metas, de um modo geral, se limitam a uma medição das realizações e não dos impactos22. Por conseguinte, a avaliação dos PRR e o pagamento aos Estados‑Membros não dependem, intrinsecamente, do impacto das reformas e dos investimentos.

A falta de informação resulta numa lacuna de garantia e prestação de contas a nível da UE na proteção dos interesses financeiros da União

32 Os Estados‑Membros e a Comissão devem assegurar a proteção eficaz dos interesses financeiros da União, em consonância com as respetivas competências23. Neste contexto, os Estados‑Membros «adotam as medidas adequadas para proteger os interesses financeiros da União e para assegurar que a utilização de fundos em relação a medidas apoiadas pelo mecanismo cumpra o direito da União e o direito nacional aplicáveis, em especial relativamente à prevenção, deteção e correção de fraudes, corrupção e conflitos de interesses»24. Esta obrigação é igualmente explicitada nas convenções de financiamento celebradas com os Estados‑Membros. Se os Estados‑Membros não recuperarem qualquer montante indevidamente pago em casos de fraude, corrupção ou conflito de interesses ou de incumprimento grave das obrigações decorrentes da convenção de financiamento (como o duplo financiamento), a Comissão pode fazê‑lo.

33 Nesta matéria, a Comissão definiu, no RAA da DG ECFIN relativo a 2021, a sua «responsabilidade residual» na proteção dos interesses financeiros da União. Tal implica, segundo este RAA, que os Estados‑Membros são os únicos responsáveis por verificar se o financiamento do MRR foi corretamente utilizado em conformidade com todos os regulamentos nacionais e da UE aplicáveis. A responsabilidade da Comissão limita‑se às três irregularidades graves (fraude, corrupção e conflitos de interesses) e às obrigações decorrentes da convenção de financiamento, nomeadamente o duplo financiamento25. Em consequência, a estratégia de auditoria do MRR prevê que a Comissão não realizará auditorias para verificar o cumprimento das regras nacionais e da UE26. Nas suas auditorias de sistemas, a Comissão centra‑se nos sistemas aplicados pelos Estados‑Membros para prevenir, detetar e retificar estas três irregularidades graves e o duplo financiamento.

34 A experiência do Tribunal mostra que o incumprimento das regras nacionais e da UE, designadamente em matéria de contratação pública, auxílios estatais e elegibilidade, é prevalecente noutros programas de despesas da UE27, constituindo, por conseguinte, um risco significativo. Porém, o Tribunal observa que as auditorias de sistemas da Comissão não contemplam o cumprimento dessas regras e que os Estados‑Membros dispõem de poucas orientações a este respeito.

35 Consequentemente, são escassas as informações verificadas a nível da UE para determinar se, e de que forma, os sistemas dos Estados‑Membros cobrem adequadamente o risco significativo de os projetos de investimento financiados pelo MRR não cumprirem as regras nacionais e da União. Esta falta de verificação não permite à Comissão dar uma garantia total, já que não cobre o cumprimento das regras nacionais e da UE pelos projetos de investimento financiados pelo MRR.

36 A responsabilidade que a Comissão assume em termos de proteção dos interesses financeiros da União reflete‑se na declaração de fiabilidade constante do RAA da DG ECFIN relativo a 2021, que não vai além do aspeto específico definido no artigo 22º, nº 5, do Regulamento. A Comissão dá a garantia de recuperar qualquer montante devido ao orçamento da União em casos de fraude, corrupção ou conflito de interesses que não tenham sido corrigidos pelo Estado‑Membro ou de incumprimento grave comprovado da convenção de financiamento. Por este motivo, existe uma lacuna de prestação de contas a nível da UE.

A Comissão concebeu um amplo processo para verificar o cumprimento dos marcos e das metas

37 O sistema de controlo da Comissão deve assegurar que os pagamentos do MRR se baseiam no cumprimento satisfatório dos marcos e das metas previamente estabelecidos28. Deve igualmente assegurar que as medidas relacionadas com os marcos e as metas anteriormente cumpridos não são revertidas.

38 Para o efeito, a Comissão criou um processo que prevê, antes do pagamento a um Estado‑Membro, a realização de verificações ex ante, que se baseiam principalmente numa análise documental dos elementos apresentados pelo Estado‑Membro para comprovar que os marcos e as metas foram cumpridos de forma satisfatória. A Comissão realiza auditorias ex post depois de um Estado‑Membro ter recebido o pagamento.

39 O Tribunal analisou os procedimentos e a documentação da Comissão, a fim de avaliar se a conceção das suas verificações ex ante e auditorias ex post lhe permite avaliar corretamente o cumprimento dos marcos e das metas. Como parte dos seus trabalhos no âmbito da Declaração de Fiabilidade relativa a 2021, o Tribunal examinou igualmente a forma como a Comissão realiza as suas verificações ex ante na prática, para determinar eventuais insuficiências nos seus procedimentos.

Apesar do amplo processo de verificação ex ante do cumprimento dos marcos e das metas, há questões que subsistem

A verificação ex ante do cumprimento dos marcos e das metas prevê um amplo processo de avaliação

40 O Regulamento exige que a Comissão avalie se os marcos e as metas pertinentes estabelecidos na decisão de execução aplicável do Conselho são cumpridos de forma satisfatória29. Os controlos ex ante que a Comissão previu para os pagamentos no âmbito do MRR devem permitir‑lhe verificar se o pedido de pagamento de um Estado‑Membro é corroborado por provas que atestem o cumprimento satisfatório dos marcos e metas em causa. Devem também estar bem documentados.

41 Uma vez cumpridos os marcos e as metas pertinentes acordados, os Estados‑Membros apresentam à Comissão, para avaliação, um pedido de pagamento devidamente justificado (ponto 10). A Comissão verifica os elementos de prova apresentados pelos Estados‑Membros no âmbito da sua avaliação preliminar, para verificar se os marcos e as metas subjacentes ao pedido de pagamento foram cumpridos de forma satisfatória.

42 O processo de avaliação preliminar da Comissão envolve vários intervenientes, sendo os mais importantes as unidades geográficas da DG ECFIN e o Grupo de Trabalho Recuperação e Resiliência, que desempenham o papel principal na verificação ex ante e na avaliação dos pedidos de pagamento. Após a apresentação dos pedidos de pagamento dos Estados‑Membros, as unidades geográficas devem efetuar uma análise documental e uma avaliação das provas que os acompanham.

43 O processo de avaliação preliminar envolve vários elementos:

  • as unidades geográficas estão em contacto permanente com as autoridades dos Estados‑Membros sobre os progressos realizados e o cumprimento dos marcos e das metas até à apresentação dos pedidos de pagamento, bem como posteriormente;
  • várias unidades horizontais da DG ECFIN participam na avaliação; por exemplo, a unidade jurídica é responsável pela revisão da avaliação preliminar, a fim de garantir a sua qualidade e correção no plano jurídico;
  • a Comissão procede a consultas interserviços às DG e serviços competentes, primeiro de caráter técnico e informal e, em seguida, de caráter formal, com o objetivo de explorar os conhecimentos especializados, mais vastos, dos outros serviços da Comissão que lidam direta e diariamente com os domínios de intervenção em causa no que diz respeito ao cumprimento de um marco ou meta específicos.

44 Com base na avaliação ex ante descrita nos pontos anteriores e nas entrevistas com os serviços da Comissão, o Tribunal considera que esta concebeu um amplo processo de verificações ex ante para avaliar o cumprimento dos marcos e das metas. Todavia, foram constatadas algumas insuficiências relacionadas com a clareza do processo e a documentação da avaliação, que são descritas nos pontos seguintes.

As várias fases do processo de avaliação não são suficientemente descritas ou documentadas

45 O Regulamento Financeiro estipula que a eficácia do controlo interno se deve basear nas melhores práticas internacionais e incluir, em especial, pistas de auditoria adequadas30 que proporcionem uma compreensão clara do seu objetivo, da sua fonte e das conclusões alcançadas.

46 A Comissão optou por utilizar um calendário para orientar o processo de cada pedido de pagamento, resumindo as etapas a realizar, os intervenientes responsáveis e os prazos a respeitar pelas equipas envolvidas na avaliação preliminar.

47 A avaliação de cada marco ou meta é documentada e sintetizada numa «ficha de avaliação», que comporta um registo com as informações recolhidas e a análise da Comissão para a avaliação preliminar dos marcos e das metas.

48 A ficha de avaliação e o calendário contêm informações pertinentes sobre o processo de avaliação, mas o âmbito dos contributos dos vários intervenientes para as suas diferentes fases, dando origem à avaliação preliminar, não é suficientemente descrito e documentado. Por conseguinte, este processo pode nem sempre comprovar de forma satisfatória que um marco ou meta foi devidamente avaliado e documentado com o nível de pormenor exigido.

Falta de clareza quanto ao âmbito da consulta técnica às DG e aos serviços competentes

49 Embora a responsabilidade por avaliar o cumprimento dos marcos e das metas incumba ao Grupo de Trabalho Recuperação e Resiliência e à DG ECFIN, as DG e os serviços competentes podem ser convidados, no decurso de verificações ex ante, a prestar contributos técnicos para a avaliação.

50 Nestes casos, solicita‑se, em especial, que indiquem se existe algum motivo para um determinado marco ou meta não poder ser considerado como cumprido de forma satisfatória. No final do processo de avaliação preliminar, e para concluir o processo de consulta, as DG e os serviços têm a oportunidade de dar a sua opinião sobre a avaliação global durante uma consulta formal interserviços.

51 Embora o Tribunal considere que a consulta de peritos é um elemento importante do processo de avaliação, nem o seu âmbito nem o papel das DG e dos serviços consultados durante este processo foram claramente definidos (ponto 47). Além disso, a documentação das consultas técnicas nem sempre permitiu obter uma compreensão clara dos elementos/aspetos do marco ou da meta sobre os quais as DG consultadas se tinham pronunciado, nem da forma como tinham chegado a essas opiniões. Na ausência de um registo claro da natureza da consulta técnica e da decisão de avaliação tomada, é difícil determinar do que tratou efetivamente a consulta. A caixa 2 apresenta um exemplo retirado da auditoria do Tribunal no âmbito da Declaração de Fiabilidade relativa a 2021.

Caixa 2

Exemplo de contributos pouco claros e documentação insuficiente durante a consulta técnica às DG e aos serviços

Marco 330

"Os atos de execução aplicam‑se à igualdade de remuneração entre homens e mulheres e aos planos de igualdade e respetivo registo. Os objetivos dos regulamentos são os seguintes: i) assegurar o princípio da transparência salarial, a fim de identificar a discriminação devido a avaliações de funções incorretas; e ii) desenvolver planos de igualdade e assegurar a sua inscrição num registo público."

A DG Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão (DG EMPL) foi consultada e convidada a contribuir para a avaliação deste marco.

Embora o assunto tenha sido discutido oralmente com os serviços da DG EMPL e esta não tenha levantado objeções durante a consulta formal interserviços, o Tribunal não encontrou provas do âmbito exato do contributo desta DG para a avaliação. Não é claro se, por ocasião da consulta técnica, os serviços da DG EMPL avaliaram o marco como tendo sido cumprido de forma satisfatória. Também é difícil saber que elementos do marco tiveram em consideração, ou se apenas confirmaram que não tinham conhecimento de nada que pusesse em causa o cumprimento do marco.

O mesmo se aplica a outros marcos (329 e 333), que foram avaliados ao mesmo tempo que o marco 33031.

Documentação incompleta da avaliação

52 A Comissão baseia a sua avaliação do cumprimento satisfatório dos marcos e das metas nos elementos pertinentes contidos na respetiva definição e na descrição da medida conexa (ambos estabelecidos na decisão de execução aplicável do Conselho) e tem em conta as disposições operacionais.

53 No seu Relatório Anual relativo a 2021, o Tribunal constatou que a descrição de uma medida no anexo da decisão de execução do Conselho nem sempre estava em consonância com o marco e/ou a meta em causa. Por isso, resultava ambígua e suscetível de diferentes interpretações no que respeita aos elementos relevantes para a avaliação32. No entanto, o Tribunal não encontrou justificação para a Comissão ter considerado que determinados elementos da descrição da medida eram irrelevantes para a avaliação. O Tribunal constatou igualmente que as orientações da Comissão para avaliar o cumprimento satisfatório dos marcos e das metas não previam essa justificação, pelo que não era explicitamente exigido que fosse documentada. A falta de orientações claras e de documentação em tais situações torna difícil, ou mesmo impossível, que uma terceira pessoa não envolvida na negociação do PRR, ou que não tenha conhecimento prévio do processo, compreenda e acompanhe o raciocínio da Comissão.

Ainda não existe um método de suspensão do pagamento

54 O montante pago a um Estado‑Membro na sequência da apresentação de um pedido de pagamento não se baseia necessariamente nos custos estimados para alcançar os marcos e as metas incluídos nesse pedido, sendo antes o resultado das negociações com o Estado‑Membro em questão. Estas negociações têm em conta a proporção entre marcos e metas, bem como a sua importância relativa33. Se a Comissão concluir que os marcos e as metas não foram satisfatoriamente cumpridos, o Regulamento prevê que «é suspenso o pagamento da totalidade ou de parte da contribuição financeira ou, se for o caso, do empréstimo»34. As suspensões só podem ser levantadas se os Estados‑Membros apresentarem à Comissão provas do cumprimento satisfatório dos marcos ou das metas no prazo de seis meses. Se não o fizerem, a Comissão reduz proporcionalmente o montante da contribuição financeira ou do empréstimo (se aplicável). No seu Relatório Anual relativo a 2021, o Tribunal observou que a Comissão não tinha desenvolvido um método para determinar o montante a suspender35.

55 Embora a metodologia não influencie a avaliação ex ante dos marcos e das metas, a sua ausência implica que está em falta um elemento importante do sistema de controlo do MRR que garante a regularidade dos pagamentos efetuados no âmbito deste mecanismo. Além disso, reduz a transparência das disposições relativamente aos Estados‑Membros e a outras partes interessadas, dado que os critérios para calcular o impacto financeiro do incumprimento dos marcos e das metas são incertos. Neste contexto, o Tribunal remete para a recomendação 10.2 do seu Relatório Anual relativo a 2021.

As auditorias ex post podem ajudar a garantir a exatidão dos dados declarados sobre o cumprimento dos marcos e das metas

56 Embora as verificações ex ante da Comissão se baseiem principalmente em análises documentais, as auditorias ex post permitem‑lhe examinar a situação no local. Estas auditorias estão previstas no Regulamento Financeiro36 e nas convenções de financiamento celebradas com os Estados‑Membros. O seu objetivo é detetar e corrigir eventuais incumprimentos dos marcos ou das metas que surjam apenas depois da realização dos pagamentos. Devem basear‑se em todas as informações pertinentes, em procedimentos claros e bem concebidos e numa avaliação adequada dos riscos.

57 O Tribunal apreciou se a conceção das auditorias ex post da Comissão é adequada para alcançar este objetivo. Não lhe foi possível testar a execução prática dessas auditorias (ponto 21).

58 No que diz respeito ao cumprimento dos marcos e das metas, a Comissão realiza auditorias ex post baseadas nos riscos, que complementam as suas verificações ex ante. Procede também a auditorias de sistemas centradas na recolha de dados e na comunicação de informações sobre marcos e metas nos Estados‑Membros.

59 As auditorias de sistemas relativas aos marcos e às metas destinam‑se a avaliar a gestão de dados e os sistemas informáticos ou outros sistemas destinados a armazenar, recolher, agregar e comunicar marcos e metas. Visam também verificar a fiabilidade dos dados comunicados sobre os marcos e metas alcançados, incluindo a sua agregação.

60 As auditorias relativas aos marcos e às metas baseiam‑se nos riscos. Abrangem todos os marcos e metas considerados como sendo de «risco elevado» na avaliação dos riscos realizada pela Comissão e (dependendo dos recursos disponíveis) tantos quantos forem possíveis dos classificados como de «risco médio». O seu objetivo é confirmar no local as informações comunicadas pelos Estados‑Membros à Comissão na fase de verificação ex ante.

61 A Comissão seleciona as autoridades dos Estados‑Membros, os marcos e as metas a auditar com base numa avaliação global dos riscos e também numa avaliação dos riscos dos pedidos de pagamento. A seleção inicial dos Estados‑Membros a auditar tem igualmente em conta o adiantamento da sua preparação e o momento de apresentação dos pedidos de pagamento.

62 As avaliações dos riscos baseiam‑se em vários fatores, tais como:

  • a complexidade dos sistemas de controlo nacionais;
  • as auditorias realizadas pelos Estados‑Membros;
  • o risco de as medidas dos PRR serem cofinanciadas por outros fundos da UE;
  • os tipos de destinatários finais.

63 As auditorias relativas aos marcos e às metas visam dar uma garantia ex post adicional sobre o cumprimento satisfatório dos mesmos. Por outro lado, as auditorias de sistemas relativas aos marcos e às metas visam assegurar a adequação e fiabilidade dos sistemas nacionais de recolha e armazenamento de informações a comunicar sobre esses marcos e metas.

64 O documento «Enquiry planning memorandum» da DG ECFIN contém orientações pormenorizadas sobre as referidas auditorias (relativas aos marcos e às metas e de sistemas), bem como vários modelos a utilizar para o efeito.

65 Na sequência da sua análise dos documentos de planeamento das auditorias ex post, o Tribunal considera‑os globalmente bem elaborados em termos dos trabalhos e documentação previstos, mas a sua execução efetiva só poderá ser avaliada numa fase posterior. O planeamento inicial dos trabalhos de auditoria para 2022 e 2023 também indica que a sua cobertura será ampla. Estão planeadas auditorias em 20 Estados‑Membros, das quais 20 à gestão de dados e aos sistemas informáticos e sete à fiabilidade dos dados comunicados.

A falta de orientações aumenta o risco de não se detetar a reversão de medidas relacionadas com marcos e metas já cumpridos

66 Para um marco ou meta que foi cumprido e pago ser significativo e eficaz, a medida conexa não deve ser revertida numa fase posterior. O Regulamento contempla este risco e estabelece que o "cumprimento de forma satisfatória dos marcos e das metas pressupõe que o Estado‑Membro em causa não tenha revertido as medidas relacionadas com os marcos e as metas anteriormente cumpridos de forma satisfatória"37. De acordo com as convenções de financiamento, o pedido de pagamento apresentado pelo Estado‑Membro deve confirmar que não é o caso.

67 A declaração confirmativa dos Estados‑Membros é uma componente essencial do controlo da reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos. Além disso, segundo a Comissão, dado que as unidades geográficas asseguram um acompanhamento e um diálogo permanente com as autoridades dos Estados‑Membros, podem também detetar marcos e metas cujas medidas tenham sido revertidas.

68 A reversão só pode acontecer quando se tiver considerado que um marco ou uma meta foram cumpridos satisfatoriamente, não podendo, por conseguinte, ser verificada através de procedimentos ex ante. Por esse motivo, os controlos relativos a este aspeto devem ser realizados ex post.

69 Até à data, a Comissão não elaborou quaisquer orientações sobre a natureza exata da reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos, as circunstâncias em que se considera que ocorreu essa reversão ou a forma como os serviços da Comissão e as autoridades dos Estados‑Membros devem acompanhar esta situação. A inexistência destas orientações aumenta o risco de os Estados‑Membros e a Comissão não poderem detetar de forma adequada e coerente todos os casos de reversão.

70 A Comissão também ainda não elaborou orientações sobre o impacto das referidas reversões nos pedidos de pagamento passados ou em curso.

Os controlos da Comissão poderiam apoiar a sua avaliação dos sistemas dos Estados‑Membros, mas os procedimentos de comunicação de informações sobre fraudes e de correção das insuficiências têm as suas limitações

As auditorias planeadas pela Comissão poderiam permitir‑lhe avaliar os sistemas de controlo dos Estados‑Membros relacionados com a fraude, a corrupção, os conflitos de interesses e o duplo financiamento

71 A proteção dos interesses financeiros da União implica que a execução do MRR deve respeitar a legislação nacional e da UE aplicável, nomeadamente no que diz respeito à prevenção, deteção e correção de fraudes, corrupção e conflitos de interesses. O mesmo se aplica ao risco de duplo financiamento.

72 Quando a Comissão menciona o seu papel na proteção dos interesses financeiros da UE, remete‑se a uma responsabilidade residual, em que se limita a garantir que os Estados‑Membros dispõem de sistemas adequados e a intervir sempre que estes não cumpram as suas obrigações de controlo em matéria de prevenção, deteção e correção de fraudes, corrupção e conflitos de interesses, bem como de duplo financiamento (ponto 33).

73 As auditorias planeadas pela Comissão refletem esta limitação e incidem nos sistemas de controlo dos Estados‑Membros para a prevenção, deteção e correção da fraude, da corrupção, dos conflitos de interesses e do duplo financiamento. Devem basear‑se em todas as informações pertinentes, em procedimentos claros e bem concebidos e numa avaliação adequada dos riscos. O Tribunal analisou o procedimento e os documentos de planeamento da Comissão para estas auditorias.

74 A Comissão definiu o seu trabalho de auditoria relacionado com a proteção dos interesses financeiros da União na sua estratégia de auditoria.

75 A estratégia de auditoria do MRR prevê que a Comissão realize, pelo menos, uma auditoria de sistemas separada por Estado‑Membro durante a execução deste mecanismo. O objetivo destas auditorias é dar à Comissão a garantia de que os sistemas de controlo dos Estados‑Membros são capazes de prevenir, detetar e corrigir casos de fraude, corrupção, conflitos de interesses e duplo financiamento. Segundo o planeamento inicial dos trabalhos de auditoria para 2022 e 2023, estavam previstas 21 auditorias sobre a proteção dos interesses financeiros da UE.

76 As auditorias de sistemas relativas a fraude, corrupção, conflitos de interesses e duplo financiamento poderão permitir que a Comissão avalie os sistemas de que os Estados‑Membros dispõem para o efeito, mas a eficácia destas auditorias só pode ser avaliada numa fase posterior. Além disso, o Tribunal detetou limitações que afetam elementos diferentes do sistema de controlo da Comissão e que são apresentadas nos pontos seguintes.

A escassez de informações sobre as auditorias dos Estados‑Membros pode afetar o valor acrescentado das suas declarações de gestão e resumos

77 Os pedidos de pagamento dos Estados‑Membros têm de ser acompanhados de uma declaração de gestão, apoiada por um resumo das auditorias realizadas a nível nacional (ponto 10). Este resumo é analisado pela DG ECFIN para encontrar informações que possam ser relevantes para as verificações ex ante do cumprimento dos marcos e das metas ou para as suas auditorias. As declarações de gestão dos Estados‑Membros devem dar garantias de que os fundos foram geridos em conformidade com todas as regras nacionais e da UE aplicáveis, em especial as relativas à prevenção de conflitos de interesses, fraude e corrupção. Os Estados‑Membros devem igualmente confirmar que as irregularidades detetadas durante as suas auditorias foram corrigidas, conforme adequado, e os fundos devidamente recuperados junto dos destinatários finais. A Comissão analisa estes documentos para verificar se foram encontradas insuficiências dos sistemas ou casos de fraude, corrupção ou conflito de interesses e se foram tomadas medidas corretivas para proteger os interesses financeiros da União. Quando se trata do primeiro pedido de pagamento, verifica igualmente se foram cumpridos os marcos de controlo e de auditoria acrescentados durante a avaliação do PRR.

78 O valor acrescentado das declarações de gestão e dos resumos das auditorias depende do âmbito e da qualidade do trabalho de auditoria das autoridades nacionais. A Comissão publicou orientações destinadas aos Estados‑Membros sobre a elaboração dos resumos das auditorias no âmbito do MRR, que definem o tipo de informações que estes devem conter e explicam os tipos de auditorias que as autoridades dos Estados‑Membros devem realizar. O Tribunal observa que não existem orientações precisas sobre o âmbito e a conceção destas auditorias, já que o Regulamento não fornece qualquer base jurídica a este respeito.

79 Relativamente aos quatro pedidos de pagamento recebidos em 2021, a Comissão observou que, devido ao curto período entre a aprovação dos planos e a apresentação desses pedidos, o âmbito do trabalho de auditoria realizado pelas autoridades nacionais era, em geral, reduzido38. As informações da Comissão sobre a qualidade do trabalho em que se apoia o resumo das auditorias e sobre os elementos do MRR que os Estados‑Membros vão fiscalizar durante o ciclo de vida deste mecanismo baseiam‑se em dois elementos: i) intercâmbios com as autoridades nacionais de auditoria e ii) avaliação das estratégias destas pela Comissão. A Comissão informou o Tribunal de que apenas prevê apoiar‑se nos resultados das auditorias nacionais depois de confirmar a sua fiabilidade realizando os seus próprios trabalhos de auditoria.

A comunicação de informações sobre fraudes e as orientações relativas à correção de insuficiências nos sistemas dos Estados‑Membros não estão completamente desenvolvidas

Ausência de uma metodologia centralizada e normalizada para a comunicação de informações sobre fraudes

80 No que respeita aos fundos da política de coesão, as autoridades dos Estados‑Membros são obrigadas a comunicar à Comissão quaisquer irregularidades fraudulentas e não fraudulentas detetadas no Sistema de Gestão de Irregularidades. Estas informações são um dos elementos que a Comissão utiliza para elaborar a sua avaliação dos riscos de fraude e a estratégia antifraude, que são importantes para direcionar as suas auditorias e controlos. Contrariamente à obrigação de os Estados‑Membros comunicarem informações sobre a execução da política de coesão, não têm de utilizar um sistema informático integrado para transmitir à Comissão irregularidades fraudulentas e não fraudulentas detetadas na aplicação do MRR.

81 Na declaração de gestão, os Estados‑Membros devem mencionar eventuais casos de fraude, corrupção e conflito de interesses detetados (bem como as medidas corretivas tomadas). Contrariamente ao Sistema de Gestão de Irregularidades, não é claro em que momento deve ser assinalada a deteção de um caso de fraude, se existe um limiar de comunicação e quais as informações normalizadas a enviar acerca de cada caso e das medidas corretivas tomadas. A falta de informações centralizadas e normalizadas a nível da Comissão sobre suspeitas de fraude, conflitos de interesses e casos de corrupção detetados pelas autoridades dos Estados‑Membros dificulta a realização de uma avaliação adequada dos riscos de fraude, que é fundamental para direcionar eficazmente as auditorias ex post relativas à proteção dos interesses financeiros da União.

82 Juntamente com os Estados‑Membros, a Comissão tem de apresentar anualmente ao Parlamento Europeu e ao Conselho um relatório sobre as medidas tomadas para combater a fraude e outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da UE. Um elemento fundamental deste relatório são as informações e os dados anuais sobre fraudes e irregularidades que afetam as despesas da UE. Se a Comissão não dispuser de informações centralizadas e normalizadas sobre fraudes e outras atividades ilegais que afetem os pagamentos do MRR, o relatório arrisca‑se a dar uma imagem incompleta.

Atualmente, as contrapartes não fiáveis não são comunicadas nem excluídas

83 Atualmente, os Estados‑Membros não são obrigados a usar o sistema de deteção precoce e de exclusão da Comissão para as medidas no âmbito do MRR. Assim sendo, uma das ferramentas disponíveis para proteger os interesses financeiros da União não é aplicável ao MRR.

84 Por esse motivo, no seu parecer sobre a proposta de reformulação do Regulamento Financeiro, o Tribunal acolheu favoravelmente a proposta da Comissão de assegurar a aplicação de disposições adequadas de exclusão aos programas de despesas em regime de gestão direta, como o MRR, em que os Estados‑Membros são os beneficiários39. Para o sistema de deteção precoce e de exclusão da Comissão funcionar com eficácia, é fundamental que esta disponha de informações credíveis sobre contrapartes potencialmente não fiáveis.

Não foram elaboradas orientações internas relativas às correções

85 O Regulamento confere à Comissão o direito de intervir sempre que considere que o sistema de um Estado‑Membro não protege adequadamente os interesses financeiros da União. Para o efeito, prevê o direito de a Comissão "reduzir proporcionalmente o apoio concedido ao abrigo do mecanismo e de recuperar qualquer montante devido ao orçamento da União ou de solicitar o reembolso antecipado do empréstimo, em casos de fraude, corrupção e conflitos de interesses lesivos dos interesses financeiros da União que não tenham sido corrigidos pelo Estado‑Membro ou de incumprimento grave das obrigações decorrentes dos referidos acordos"40.

86 O mesmo artigo do Regulamento dispõe igualmente que, ao "decidir sobre o montante da recuperação e redução ou o montante a reembolsar antecipadamente, a Comissão deve respeitar o princípio da proporcionalidade e ter em conta a gravidade da fraude, da corrupção e dos conflitos de interesses lesivos dos interesses financeiros da União ou do incumprimento de uma obrigação".

87 Embora as convenções de financiamento contenham disposições gerais aplicáveis às correções fixas, a Comissão ainda não elaborou orientações internas sobre a aplicação das mesmas. A título de exemplo, remete‑se para as Orientações para o cálculo das correções financeiras no âmbito dos procedimentos relativos à conformidade e ao apuramento financeiro das contas.

88 A falta de orientações internas sobre a aplicação destas correções fixas reduz a transparência e não garante a coerência das disposições do MRR relativamente aos Estados‑Membros e a outras partes interessadas41.

Conclusões e recomendações

89 O MRR segue um novo modelo de aplicação em que o pagamento da Comissão aos Estados‑Membros se baseia no cumprimento de marcos e metas. O Tribunal conclui que, num período relativamente curto, a Comissão concebeu um sistema de controlo que prevê um conjunto de amplas verificações ex ante, complementadas por auditorias no local, a fim de avaliar se os marcos e as metas foram cumpridos de forma satisfatória. No entanto, este sistema de controlo disponibiliza poucas informações verificadas a nível da União que atestem que os projetos de investimento financiados pelo MRR respeitam as regras nacionais e da UE. A falta destas informações afeta a garantia que a Comissão pode dar sobre a proteção dos interesses financeiros da União e resulta numa lacuna de prestação de contas a nível da UE.

90 O Tribunal constatou que as verificações ex ante realizadas pela Comissão para avaliar o cumprimento dos marcos e das metas eram abrangentes. Como referiu no capítulo 10 do Relatório Anual relativo a 2021, detetou insuficiências no que respeita à documentação da avaliação da Comissão e indicou que ainda não estava disponível um método de suspensão (parcial) ou redução de pagamentos, tendo formulado as recomendações 10.1 e 10.2. Constatou igualmente que a definição e a documentação do âmbito e dos objetivos das diferentes fases da avaliação preliminar poderiam ser melhoradas, nomeadamente no que diz respeito à consulta técnica a outras DG e serviços (pontos 40 a 55).

Recomendação 1 – Melhorar os procedimentos de verificação ex ante

Com base na experiência adquirida até à data, a Comissão deve desenvolver mais os procedimentos destinados a garantir uma documentação adequada da sua avaliação e clarificar o papel e o âmbito da consulta técnica a outras DG e serviços.

Prazo de execução: 2023

91 A Comissão planeou amplas auditorias ex post ao cumprimento dos marcos e das metas. O planeamento dos trabalhos de auditoria para 2022 também indica uma cobertura alargada dos Estados‑Membros. Porém, a adequação das auditorias ex post previstas só poderá ser avaliada no futuro (pontos 56 a 65).

92 O êxito da execução do MRR depende de os marcos ou as metas serem cumpridos e, subsequentemente, de as medidas conexas não serem revertidas. O Tribunal observa que, atualmente, não existem orientações que garantam um entendimento coerente do que constitui uma reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos, da forma de atenuação do risco desta reversão e do impacto que a reversão teria nos pagamentos efetuados ou em curso (pontos 66 a 70).

Recomendação 2 – Elaborar orientações sobre a reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos

A Comissão deve elaborar orientações e procedimentos sobre a reversão de medidas relacionadas com marcos e metas anteriormente cumpridos, a fim de assegurar uma interpretação e uma aplicação coerentes.

Prazo de execução: 2023

93 A Comissão elaborou documentos de planeamento para as suas auditorias de sistemas, através das quais visa abranger o sistema de controlo aplicado por cada Estado‑Membro para proteger os interesses financeiros da União (pontos 71 a 76). Contudo, o Tribunal observa que estas auditorias incidirão apenas nos sistemas dos Estados‑Membros relacionados com a fraude, a corrupção, os conflitos de interesses e o duplo financiamento. Consequentemente, são escassas as informações verificadas a nível da UE sobre o cumprimento das regras nacionais e da União pelos projetos de investimento financiados pelo MRR. A falta destas informações afeta a garantia que a Comissão pode dar a nível da UE. A responsabilidade que a Comissão assume em termos de proteção dos interesses financeiros da União reflete‑se na declaração de fiabilidade constante do Relatório Anual de Atividades da DG ECFIN relativo a 2021, que não vai além da garantia de recuperar qualquer montante devido em casos de fraude, corrupção ou conflito de interesses que não tenham sido corrigidos pelo Estado‑Membro ou de incumprimento grave da convenção de financiamento (pontos 28 a 36).

Recomendação 3 – Colmatar a lacuna de garantia a nível da UE no que diz respeito ao cumprimento das regras nacionais e da União

A Comissão deve determinar as medidas necessárias para colmatar a lacuna de garantia a nível da UE no que diz respeito ao cumprimento das regras nacionais e da União pelos projetos de investimento financiados pelo MRR.

Prazo de execução: 2023

94 O Tribunal considera que o valor real das declarações de gestão e dos resumos das auditorias dos Estados‑Membros dependerá, em grande medida, do âmbito e da qualidade destas auditorias e observa que não existem orientações precisas sobre o seu âmbito e a sua conceção. O âmbito do trabalho de auditoria realizado pelas autoridades nacionais no primeiro ano foi, em geral, reduzido. As informações da Comissão sobre a qualidade desse trabalho baseiam‑se em intercâmbios com as referidas autoridades e na avaliação que realiza sobre as estratégias das mesmas (pontos 77 a 79).

95 No que diz respeito à comunicação de informações sobre fraudes relacionadas com o MRR (pontos 80 a 84), o Tribunal observa que:

  • a falta de informações centralizadas e normalizadas sobre fraudes registadas no Sistema de Gestão de Irregularidades significa que os dados disponíveis para apoiar o planeamento e o direcionamento das auditorias de sistemas estão incompletos;
  • atualmente, as contrapartes não fiáveis (destinatários finais) não são assinaladas no sistema de deteção precoce e de exclusão nem privadas do financiamento da UE. Todavia, a proposta de alteração das disposições do Regulamento Financeiro (reformulação) prevê esta situação.

Recomendação 4 – Harmonizar a comunicação de informações sobre fraudes no âmbito do MRR

A Comissão deve harmonizar a comunicação de informações sobre fraudes no quadro do MRR e, juntamente com informações sobre outras atividades ilegais no mesmo âmbito, registá‑las no Sistema de Gestão de Irregularidades.

Prazo de execução: 2023

96 As convenções de financiamento celebradas com os Estados‑Membros preveem diferentes níveis de correções fixas caso a Comissão detete, no sistema de controlo de um Estado‑Membro, uma deficiência que constitua uma violação grave da sua obrigação de proteger os interesses financeiros da União, tal como estabelecido na convenção de financiamento. Não obstante, as atuais definições dos diferentes níveis não são suficientes para permitir uma aplicação coerente destas correções fixas (pontos 85 a 88).

Recomendação 5 – Elaborar orientações internas relativas às correções

A Comissão deve elaborar orientações internas sobre a aplicação das correções fixas estabelecidas nas convenções de financiamento relativamente a insuficiências nos sistemas de controlo dos Estados‑Membros destinados a proteger os interesses financeiros da União.

Prazo de execução: 2023

O presente relatório foi adotado pela Câmara V, presidida por Jan Gregor, Membro do Tribunal de Contas, no Luxemburgo, na sua reunião de 15 de fevereiro de 2023.

 

Pelo Tribunal de Contas

Tony Murphy
Presidente

Siglas e acrónimos

DG ECFIN: Direção‑Geral dos Assuntos Económicos e Financeiros

DG EMPL: Direção‑Geral do Emprego, dos Assuntos Sociais e da Inclusão

DG: Direção‑Geral

IRUE: Instrumento de Recuperação da União Europeia

MRR: Mecanismo de Recuperação e Resiliência

PRR: plano de recuperação e resiliência

Glossário

Comité Económico e Financeiro: comité da União Europeia criado para promover a coordenação das políticas entre os Estados‑Membros.

EDES: sistema estabelecido pela Comissão para reforçar a proteção dos interesses financeiros da União e assegurar a boa gestão financeira. O seu objetivo é proteger os interesses financeiros da União contra pessoas e entidades não fiáveis que se candidatem a fundos da UE ou que tenham assumido compromissos jurídicos com a Comissão ou outras instituições, órgãos ou organismos da União.

Instrumento de Recuperação da União Europeia: pacote de financiamento que visa ajudar os Estados‑Membros da UE a recuperar do impacto económico e social da pandemia de COVID-19.

Mecanismo de Recuperação e Resiliência: mecanismo de apoio financeiro da UE para atenuar o impacto económico e social da pandemia de COVID-19 e estimular a transformação ecológica e digital.

Plano de recuperação e resiliência: documento que descreve as reformas e os investimentos que o Estado‑Membro tenciona realizar ao abrigo do Mecanismo de Recuperação e Resiliência.

Sistema de Gestão de Irregularidades: aplicação utilizada pelos Estados‑Membros para comunicar irregularidades ao OLAF, designadamente suspeitas de fraude.

Equipa de auditoria

Os relatórios especiais do TCE apresentam os resultados das suas auditorias às políticas e programas da UE ou a temas relacionados com a gestão de domínios orçamentais específicos. O TCE seleciona e concebe estas tarefas de auditoria de forma a obter o máximo impacto, tendo em consideração os riscos relativos ao desempenho ou à conformidade, o nível de receita ou de despesa envolvido, a evolução futura e o interesse político e público.

A presente auditoria de resultados foi realizada pela Câmara de Auditoria V – Financiamento e administração da UE, presidida pelo Membro do TCE Jan Gregor. A auditoria foi efetuada sob a responsabilidade do Membro do TCE Tony Murphy, com a colaboração de Wolfgang Stolz, chefe de gabinete, e Brian Murphy e Peter Borsos, assessores de gabinete; Judit Oroszki, responsável principal; Gediminas Macys, responsável de tarefa; e Kristina Kosor e Raymond Larkin, auditores. Valérie Tempez assegurou o secretariado.

Da esquerda para a direita: Peter Borsos, Judit Oroszki, Kristina Kosor, Tony Murphy, Brian Murphy, Gediminas Macys, Wolfgang Stolz, Raymond Larkin e Valérie Tempez.

Notas

1 Artigo 8º e artigo 22º, nº 1, do Regulamento.

2 Artigo 24º, nº 3, do Regulamento.

3 Artigo 22º, nº 1, do Regulamento.

4 Artigo 22º, nº 5, do Regulamento.

5 O conjunto completo de condições que os PRR devem satisfazer encontra‑se estipulado no artigo 18º, nº 4, do Regulamento.

6 Artigo 24º do Regulamento.

7 Artigo 22º, nº 2, alínea c), do Regulamento.

8 Idem.

9 Artigo 24º, nº 3, do Regulamento.

10 Relatório Especial 21/2022, Avaliação da Comissão dos planos nacionais de recuperação e resiliência – Globalmente adequada, mas subsistem riscos ligados à execução.

11 Parecer 06/2020 sobre a proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Mecanismo de Recuperação e Resiliência.

12 Relatório Especial 21/2022.

13 Relatório Anual sobre a execução do orçamento da UE relativo ao exercício de 2021, capítulo 10 – Mecanismo de Recuperação e Resiliência.

14 TCE, Documento de Análise 01/2023, Financiamento da UE através da política de coesão e do Mecanismo de Recuperação e Resiliência: uma análise comparativa.

15 Capítulo 10 do Relatório Anual do Tribunal relativo a 2021.

16 Relatório Especial 21/2022.

17 RAA da DG ECFIN relativo a 2021, anexo XIV.

18 Artigo 24º, nº 5, do Regulamento.

19 Artigo 5º do Regulamento.

20 Artigo 24º do Regulamento.

21 Pontos 56 a 61 do Relatório Especial 21/2022.

22 Ponto VIII do Relatório Especial 21/2022.

23 Ponto 80 do Documento de Análise 01/2023.

24 Artigo 22º, nº 1, e considerando 54 do Regulamento.

25 RAA da DG ECFIN relativo a 2021, p. 52.

26 Estratégia de auditoria da Comissão para o MRR, p. 3.

27 Figura 1.8 do Relatório Anual do Tribunal relativo a 2021.

28 Artigo 24º, nº 3, do Regulamento.

29 Artigo 24º, nº 3, do Regulamento.

30 Ver artigo 36º, nº 3, do Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União.

31 Anexo da proposta de decisão de execução do Conselho.

32 Ver pontos 10.24 a 10.26 do Relatório Anual do Tribunal relativo a 2021.

33 Ver ponto 73 do Relatório Especial 21/2022 do TCE.

34 Artigo 24º, nº 6, do Regulamento.

35 Ponto 10.28 do Relatório Anual do Tribunal relativo a 2021.

36 Artigo 74º, nº 6, do Regulamento Financeiro.

37 Artigo 24º, nº 3, do Regulamento.

38 RAA da DG ECFIN relativo a 2021 [em inglês], p. 60.

39 Parecer 06/2022 (nos termos do artigo 322º, nº 1, do TFUE) sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União (reformulação).

40 Artigo 22º, nº 5, do Regulamento.

41 Ponto 106 do Documento de Análise 01/2023.

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